Febre nos anos 2000, o estilo emo está de volta e une veteranos e nomes do pop

OGLOBO / EDUARDO VANINI


Anitta apostou nessa estértica em 'Boys don't cry' Foto: Reprodução/Instagram

'Emo não é uma fase.' O aviso na descrição do perfil de Lill Oliveira (@lilfrozen), de 24 anos, resume toda a convicção em torno de um estilo musical que explodiu no mundo quando ele ainda era uma criança. “Muitas pessoas tratam o emo como algo momentâneo. Mas não é verdade. Se toca no seu coração, você leva para a vida inteira', filosofa o rapaz, que começou a gostar do gênero por influência do pai e hoje produz a festa Emo in Rio.

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A julgar pelo que vem se desenhando na cultura pop nos últimos meses, não é em vão que Lill tem se vestido de preto da cabeça aos pés e carregado na maquiagem. Tanto a geração que viveu o auge dessa cena quanto expoentes da nova safra de cantores têm anunciado que chegou a hora de tirar os coturnos (e os cintos com rebites, e as saias pregueadas, e os alfinetes) do fundo do armário novamente. O sinal mais barulhento veio do festival When We Were Young, que acontece só em outubro, nos Estados Unidos, mas causou frisson ao anunciar o line-up com nomes como My Chemical Romance, Paramore e Avril Lavigne (esta também no Rock in Rio). A procura foi tanta, que os organizadores precisaram providenciar uma data extra com as mesmas atrações. Enquanto isso, no pop, Anitta mergulhou nessa estética em seu recém-lançado clipe “Boys don’t cry', ecoando acordes que já vinham sendo resgatados por Willow Smith e Olivia Rodrigo.

Vocalista da banda Fresno, uma das mais icônicas da cena no Brasil e que acaba de lançar o EP “VTQMV RMXS 01', Lucas Silveira acredita que o resgate tem a ver com uma redescoberta do que aconteceu há 20 anos. “São pessoas que viveram isso, às vezes, até escondido, como se fosse algo ruim. Hoje são adultas, não têm vergonha e sentem saudade da juventude', analisa. “Isso funciona também como uma forma de corrigir o curso da história, de desmistificar e mostrar, para o público em geral, que o emo é massa, tinha muita banda boa.'

Lucas localiza a raiz do emo nos anos 1990, com uma forte influência do punk rock e do hardcore, que dominavam a cena alternativa americana, e de bandas que seguiam pelas vertentes do guitar rock e do indie. “Naquela época, não tinha exatamente um visual. A aparência era de um maluco de banda. A coisa do emo só aconteceu quando foi ficando mais mainstream, depois do My Chemical Romance.'

O músico também destaca que o emo floresceu em meio a uma mudança comportamental, em que os jovens começaram a falar de maneira mais madura sobre emoções do ponto de vista masculino. Embora essa característica tenha sido, muitas vezes, usada de maneira deturpada para descredibilizar a cena, ela se revela ainda mais potente duas décadas depois.

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É o que diz Moysés Pinto Neto, professor do programa de pós-graduação em estudos culturais da Universidade Luterana do Brasil. “Houve ali uma transição de uma juventude mais agressiva e masculinizada, que ouvia muito Nirvana e Oasis, para uma turma mais sensível, interessada em transgredir pelo caminho do escapismo. Queriam um mundo em que fossem compreendidos', afirma. “Também são figuras andrógenas, que propõem uma desconstrução de masculinidade, algo muito pertinente a debates tão caros nos dias de hoje.'

Diante de tantas interpretações possíveis para esse retorno, Adriana Amaral, coordenadora do laboratório CultPop da Unisinos, lembra que, como já foi apontado por teóricos, é comum que tendências sejam resgatadas a cada 20 anos. “Eu sempre brinco que essas estéticas são meio zumbis. Quando pensamos que morreram, elas retornam', diz, prevendo uma volta de outras vertentes do rock nos próximos anos. “É quando a coisa deixa de ser cafona e emerge numa pegada mais alternativa.'

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Ronaldo Tagashira Junior que o diga. Fundador do Bloco Emo, ao lado do sócio Alexandre Cavalcanti, ele arrisca dizer que é parte dessa retomada. Afinal, no primeiro desfile em São Paulo, há quatro anos, esperava cinco mil pessoas e foi surpreendido por uma multidão de 25 mil. No ano seguinte, o público já era o dobro. “Essa volta, vale destacar, não tem sido feita com uma nova roupagem. Estão tentando fazer como era nos anos 2000', diz o rapaz, que estuda a possibilidade de promover um festival nos moldes do When We Were Young por aqui. “Não acreditava que fôssemos voltar ao mainstream tão fácil, mas aconteceu. O emo, em 2022, virou coisa hypada.'

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